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 Conhecimento 

Comunicação Empresarial: uma visão crítica

Prof. Dr. Wilson da Costa Bueno

Professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP, editor de 8 sites temáticos em Comunicação/Jornalismo.

O papel da Intranet na comunicação interna

Com a popularização das novas tecnologias, a Intranet passou a integrar o espaço de comunicação de boa parte das nossas organizações, o que não quer dizer que a maioria das intranets existentes esteja cumprindo, efetivamente, o seu papel. Como analogia, podemos lembrar os house-organs, que também estão presentes na quase totalidade das organizações brasileiras, mas que continuam se caracterizando por equívocos imensos.

 

Alguns motivos certamente explicam a ineficácia das intranets enquanto ambientes para a expressão da comunicação interna. 

 

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que muitas organizações têm criado intranets sem discutirem amplamente a função que elas devem desempenhar no chamado mix da comunicação interna. A Intranet, assim como o house-organ, não pode responder por toda a comunicação interna de uma organização e, por melhor que seja concebida e alimentada, ocupará apenas uma parte (ainda que importante) do processo de interação com os públicos internos. Há organizações que jogam toda a responsabilidade em cima da Intranet para descobrirem, posteriormente, que ela tem restrições em seu sistema de produção (conteúdos e tecnologia) e em sua utilização.

Em segundo lugar, a implementação e manutenção de uma Intranet requerem um planejamento bem elaborado, que não se limita à mera descrição de seus objetivos e à indicação de recursos necessários para colocá-la e mantê-la no ar (recursos humanos, tecnológicos e financeiros). Ela precisa estar "colada" aos princípios e valores da organização e integrar, de maneira efetiva, o seu processo de gestão , cumprindo determinadas funções ou buscando o atendimento de determinadas metas.

 

É sempre importante lembrar que não se cria uma Intranet impunemente, ou seja, na medida em que uma intranet é incorporada à comunicação interna , ela a impacta de maneira decisiva sobretudo porque tende a acelerar a circulação das informações. Logo, uma organização que tem uma intranet assume, implicitamente, um compromisso de disponibilizar rapidamente as informações do interesses dos públicos internos e de permitir / estimular a interação. Fica claro que uma organização que não tem uma "cultura de comunicação" se sentirá ameaçada pela presença da Intranet porque ela altera, de maneira dramática (se funcionar, é claro!), as formas de relacionamento entre os funcionários.

 

Em terceiro lugar, a Intranet não é, como postulam alguns, uma Internet voltada para os públicos internos. Embora visualmente elas possam estar próximas (às vezes, a Intranet é acionada a partir de um menu ou botão existente na homepage de uma organização), a Intranet e a Internet, em termos conceituais, são bastante distintas. A Intranet tem como atributos básicos: a) um público cativo e delimitado (os funcionários, entendidos aqui no seu sentido mais amplo) e b) em função do perfil dos públicos internos, conteúdos e linguagens (discursos) específicos.

 

Finalmente, a Intranet só faz sentido se a organização que a implementa tem condições de gerenciar as informações e os relacionamentos estabelecidos a partir dela. A organização não pode contemplar a Intranet como um repositório de normas, informações administrativas, como as que usualmente integram a chamada "comunicação burocrática". A Internet não se confunde nem como banco de dados on line e muito menos com mural eletrônico.

 

A Intranet precisa ser pensada como uma rede que potencializa a circulação de informações de interesse da organização e de seus públicos internos e promove a interação entre a organização (sua direção e chefias) e os seus funcionários, bem como dos funcionários entre si. A Intranet é, primordialmente, um ambiente de comunicação.

 

Isso significa, dentro da nossa concepção de comunicação, que ela deve abrir espaço para uma interação democrática, para a troca de informações , conhecimentos e experiências, possibilitando, assim, que, ainda que não próximos, os funcionários estejam em interação.

 

Muitas organizações gerenciam a Intranet com mão de ferro, inibindo a participação dos funcionários. A auto-censura torna as mensagens e os relacionamentos burocráticos e artificiais e a participação não implica em envolvimento ou compromisso. Outras relegam-na ao abandono, não a avaliam periodicamente para verificar se ela está funcionando adequadamente e, assim, retiram dela o seu caráter estratégico. Olhada à distância, a Intranet sem o gerenciamento adequado parece um caos cibernético, com informações transitando sem rumo e pessoas "dando tiro para todo o lado". 

Quando é esta a situação que prevalece, a Intranet tem a tendência de se igualar à Internet em sua dimensão menos produtiva: mero depósito ou tráfego de informações, não sistematizadas, não articuladas, que não contribuem para dar suporte a um processo de gestão do conhecimento ou mesmo para reforçar a identidade organizacional.

O que deve conter uma Intranet?

Evidentemente, a resposta a esta questão não é fácil porque, como assinalamos anteriormente, a Intranet pode cumprir funções diversas, dependendo dos objetivos da organização.

 

Embora não seja recomendável , porque representa a sua perspectiva menos rica, ela pode ser pensada como ambiente para a circulação de informações administrativas (normas, legislação, ordens) que pressupõe uma participação consentida (portanto, controlada) e baixo índice de interação. Nesse caso, ela representa basicamente a versão eletrônica dos murais, dos memorandos, dos códigos e assume seu perfil burocrático, o que, convenhamos, não estimula o seu uso. Seria o equivalente a um dicionário ou a uma lista telefônica a que se recorre em determinadas situações: útil, mas desinteressante. Como ambiente de comunicação, pouco tem a acrescentar ao que já existe em papel, embora a consulta aos dados/informações possa ser agilizada.

 

A Intranet ideal, a Intranet que funciona, tem uma dimensão mais ampla do que a meramente administrativa ou burocrática e pode incorporar uma série de instrumentos, veículos, canais, sistemas de relacionamento ou interação etc, tornando-se, dessa forma, parte importante do processo de comunicação interna.

 

Ela pode incorporar todos os house-organs ou veículos da organização, mas , evidentemente, eles devem estar formatados para este ambiente, portanto, maximizando os recursos de hipertexto, hiperlink e a integração com a própria Web. Assim, uma matéria presente no house-organ, em sua versão eletrônica, deveria apontar para outras fontes na Internet, matérias anteriores sobre o mesmo tema , textos explicativos ou que ampliam o escopo da matéria e assim por diante. Um equívoco recorrente é transportar para a Intranet (em PDF ou não) o house-organ impresso, estático como concebido no papel, ignorando as potencialidades do ambiente eletrônico.

 

A Intranet pode (ou deve?) abrigar notícias de interesse da organização e dos funcionários, sejam elas de caráter interno ou externo (clipping seletivo de jornais locais ou nacionais) de modo a criar um universo comum de informações e conhecimentos nas várias áreas (negócios, marketing, planejamento, mercado, política e economia etc).

 

A Intranet pode abrigar cases ocorridos na empresa (ou nos concorrentes, por que não?) de modo a disseminar as boas práticas, a provocar o debate e a reflexão sobre temas que dizem respeito ao dia-a-dia da organização.

 

A Intranet pode incluir um amplo leque de informações para facilitar a vida dos funcionários, como notícias sobre tempo/clima; situação do trânsito - particularmente útil para unidades que se situam nas grandes cidades ; calendário, com a indicação dos feriados prolongados e a política da empresa para esses momentos (compensações, por exemplo); uso dos planos de saúde empresariais; telefones úteis, interna e externamente etc.

 

A Intranet pode incorporar fóruns, murais, chats, obedecidas as regras de boa convivência, e estimular o debate de temas de interesse, ainda que os comentários e opiniões não sejam os mesmos advogados pelas chefias e direção. Obviamente, essa participação é mais ou menos efetiva em função da cultura da organização porque, numa gestão autoritária, dificilmente o funcionário identificado (não há manter-se no anonimato numa Intranet) irá "falar francamente".

 

A Intranet pode permitir a expressão de competências/habilidades dos funcionários, abrindo espaço para a publicação de textos informativos (reportagens, notícias, comentários) ou literários (contos, poesias etc) ou artísticos (desenhos, pinturas etc) ou mesmo potencializar a oferta/troca de produtos/serviços (muitas vezes o encanador ou o eletricista de confiança que se estava procurando pode estar dentro da empresa, assim como um colecionador de camisas de futebol , alguém que tem uma casa disponível na praia para alugar ou um DVD sem uso para vender).

 

A Intranet pode trazer informações sobre o mercado de atuação da empresa e sobre a própria empresa (quantos funcionários conhecem efetivamente a empresa em que trabalham?) e sobre direitos civis (direito do consumidor, do paciente etc).

 

A Intranet abre espaço para inúmeras alternativas e elas devem ser contempladas tendo em vista o perfil dos públicos internos e da própria organização. Cada Intranet é uma Intranet, não existe uma fórmula única, porque a Intranet, como ambiente de comunicação, deve reproduzir a cultura da organização.

 

A segmentação na Intranet

A Intranet deve também praticar a segmentação dos públicos, formatando canais de relacionamento para atender a interesses específicos dentro de uma organização. Ela pode, por exemplo, trazer newsletters ou jornais/revistas digitais para gerentes , suplementos infantis eletrônicos para os filhos dos funcionários (o ambiente permite jogos interativos e é particularmente útil para um trabalho pedagógico) ou mesmo abrigar uma rádio digital.

 

Em todos os casos, é fundamental atentar para o fato de que os públicos internos têm linguagens e demandas informativas específicas e que é preciso conhecê-las antes de formatar canais e conteúdos para atendê-los.

 

Pode-se criar e manter esses canais com alguma facilidade na Intranet e, sobretudo, com baixo custo, diferentemente do que ocorre no mundo da mídia impressa onde os recursos exigidos são maiores, assim como é maior o tempo de produção (gráfica, impressão etc).

 

Quem gerencia a Intranet?

Não é incomum percebermos, ao utilizarmos uma Intranet, que ela não foi concebida por (ou não teve a participação de) um comunicador, na medida em que a sua forma e o seu conteúdo parecem distantes das necessidades da comunicação interna. Certamente, isso não é bom porque ela deixa de cumprir uma função primordial , quase sempre desrespeitando alguns princípios aqui enumerados. Ela pode ter ignorado os perfis dos públicos internos (e, portanto, suas demandas e linguagens), pode não estar associada aos objetivos, valores e missão da organização e, sobretudo, pode constituir-se num ambiente insosso, pouco estimulante, o que, provavelmente, a condenará ao fracasso.

 

Dada a pouca importância que as organizações ainda creditam à comunicação interna, esse fato se repete mesmo com alguma freqüência e, por isso, muitas vezes a Intranet fica refém da área de Recursos Humanos (que, apenas ocasionalmente, assume na íntegra o conceito de comunicação em uma organização, infelizmente, com tendência a enxergar comunicação como risco à estabilidade institucional) ou da área de Tecnologia (nem sempre sensível às formas de utilização dos produtos que elabora, ignorando as práticas de uso).

A Intranet deve ser um trabalho, a nosso ver, de parceria, na medida em que agrega pelo menos essas 3 instâncias da empresa: a que cuida da comunicação interna (nós, da comunicação); a que, de maneira geral, tem a ver com o processo de gestão (Recursos Humanos) e a que operacionaliza, tecnicamente, a plataforma do ambiente (Tecnologia). Ela poderá cumprir seus objetivos, se planejada e executada a partir da convergência destas competências e tenderá a "patinar", caso uma destas áreas esteja ausente ou dela participe marginalmente.

 

No planejamento, devem ficar definidas as responsabilidades de cada uma das áreas, ao mesmo tempo em que devem ser capacitados os seus gestores porque se trata de um ambiente novo, com suas peculiaridades, e que deve ser de conhecimento daqueles que o administram.

 

A Intranet pode funcionar, mas, como em todos os processos organizacionais, ela não pode ser feita por amadores.

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